Chuck Norris está pendurado pelos tornozelos, à mercê do coronel Yin. Yin exige uma confissão. Chuck Norris não confessa. Horror! Um saco com uma ratazana gigante é enfiado na sua cabeça. O corpo de Chuck Norris estrebucha violentamente. Depois pára. O malvado Yin manda retirar o saco. E Chuck Norris aparece ensanguentado mas vitorioso, com a ratazana morta presa nos dentes.
Eu vi demasiados filmes americanos na minha adolescência. Filmes onde o herói aguentava pancada da grossa e soldados anónimos resistiam às mais elaboradas torturas. Desaparecido em Combate 2 é um deles. Fuga para a Vitória, com Sylvester Stallone e Pelé a triturarem arianos num campo de futebol, é outro. Já para não falar dos vários Rambo. E quem é amamentado a maus filmes de Hollywood jamais poderá compreender como é que 15 soldados britânicos são apanhados por tropas iranianas em alto mar e começam a debitar confissões sem que ninguém lhes ponha um dedo em cima. Reparem bem: eu não digo uma ratazana. Digo um dedo.
Não é a primeira vez que prisioneiros ocidentais fazem penitência diante das câmaras de televisão. Mas habitualmente apareciam um bocadinho amolgados, depois de terem saltado de um avião ou caído de um helicóptero. Estes 15 surgiram fresquíssimos, muito bem alimentados, entretidos no pingue-pongue, e depois de confessarem os seus pecados ao mundo foram vestidos pelo costureiro de Ahmadinejad e postos a andar. Assim que chegaram ao Reino Unido, começaram a contar as suas experiências traumáticas à comunicação social e aproveitaram para encher os bolsos - a única senhora dos 15 terá sacado 100 mil libras (quase 150 mil euros) por uma entrevista a uma televisão e a um jornal. Da próxima vez que os iranianos entrarem a bordo de um navio inglês, os seus marinheiros farão como o burro do Shrek, aos pulos na segunda fila, "levem-me a mim!, levem-me a mim!".
Tão fácil capitulação por parte de soldados e oficiais que era suposto estarem bem treinados só pode ter duas justificações. Uma, mais filosófica, tem a ver com a forma como o ocidente deixou de saber encarar a morte e enfrentar a dor - aqueles militares não estavam preparados para lidar com uma situação de cativeiro. A outra, mais política, tem a ver com o atoleiro em que se transformou o Iraque - se as tropas já não acreditam no que andam a fazer é evidente que não lhes apetece sacrificaram-se por uma causa que não partilham nem entendem. Ninguém pratica actos de heroísmo quando o corpo duvida do que a cabeça lhe diz. Ora, quem sai a perder no meio de tudo isto? O Ocidente, claro. Sempre o Ocidente. Que exporta o heroísmo através do cinema e a cobardia em directo, pela televisão. Onde é que tu andas, Chuck Norris.
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